O golpe vem quebrando a indústria brasileira

O golpe vem quebrando a indústria brasileira

Enquanto o PIB (Produto In­terno Bruto) brasileiro segue estagnado desde o golpe, a indústria de transformação derrete causando um revés dramático no mercado de trabalho, com queda de empregos formais e de salários. De 2014, quando o processo do golpe se inicia (logo após a eleição de Dilma) até 2017, a produção industrial manufatureira caiu pela metade, mantendo-se até hoje neste patamar.

Desde 2009, a crise interna­cional, a queda na lucratividade empresarial e do comércio internacional já haviam reduzido o interesse da indústria no país por investimentos. Políticas con­tracíclicas, iniciadas sobretudo no segundo mandato de Lula, elevaram os investimentos públicos, incentivando (e forçando) os investi­mentos produtivos privados.

 

Golpe, Lava-Jato e Plano Levy

 Mas a partir de 2014 as pressões da mídia e do mercado pelo “ajuste fiscal” acabaram levando Dilma aos cortes do Plano Levy (2015). Con­comitantemente, a operação Lava­-Jato quebrou toda a cadeia ligada à indústria petroquímica, naval e de construção civil (além de prejudicar outras correlatas, como a siderurgia etc.) provocando – só por isso – que­das de cerca de 2% anual do PIB em 2015 e 2016. Os empréstimos do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), como proporção do PIB, às empresas produtivas também foram cortados: em 2018 represen­tavam um quarto da média do 2o mandato de Lula. E agora o ministro Guedes quer usar o banco apenas para privatizar.

Já a EC-95 (teto dos gastos) de Te­mer, ao congelar os gastos públicos, piorou ainda mais a crise: os inves­timentos públicos caíram dos 4,56% do PIB (em 2010) para 1,85% do PIB (em 2017). Isso fez com que, desde 2013, os investimentos produtivos totais como proporção do PIB ca­íssem de 26% para os atuais pouco mais de 15% – o menor nível em mais de 50 anos. Entre 2014 e 2018, o PIB acumulou queda de 4,2%. Mas a produção industrial manufatureira caiu 14,4%. Assim, a participação da indústria de transformação no PIB caiu para 10,4%, o menor índice desde os anos 1930. Em 1985 tal participação havia alcançado os 36%, caindo fortemente nos anos 1990 e recuperando-se (ainda que apenas parcialmente) nos governos do PT.

Destruição de emprego e salário 

Tal indústria representa o ramo mais importante no desenvolvi­mento econômico de um país, sen­do inclusive essencial à soberania nacional. É o setor que concentra as inovações tecnológicas, cria mer­cados (e incentivos a novos investi­mentos e empregos) nas pontas de fornecimento e de distribuição, e gera empregos mais qualificados – com trabalhadores mais facilmente organizados em grandes sindicatos.

O gráfico acima mostra a dramáti­ca evolução do mercado de trabalho na indústria nacional (excluindo a extrativista). Ao final dos anos 1980 cerca de 11 milhões de trabalhadores estavam empregados (com carteira assinada) em fábricas pelo país afora. A “abertura comercial globa­lizante” e as privatizações de Collor e FHC provocaram uma gigantesca desindustrialização, que levou à destruição de quase metade de tais postos de trabalho formal. Nota-se também no gráfico que o salário médio do trabalhador industrial (deflacionado pelo ICV-Dieese e IPC-Fipe) acompanha a ten­dência geral de empregabilidade. Quando aumentam as demissões, diminui o poder de barganha dos trabalhadores e de seus sindicatos, impedindo assim a recuperação de seus salários à inflação.

Nos governos do PT, a conjun­tura internacional inicialmente favorável junto com políticas pú­blicas (ex. Conteúdo Nacional da Petrobras) ajudaram a recriar parte desses postos. Mas, o processo do golpe está forçando o emprego e o salário real caírem novamente aos mais baixos níveis do período FHC. Com alta produtividade das empresas, isso significa um brutal aumento na exploração dos traba­lhadores.

Neste ano, a situação não para de piorar. Só no Estado de São Paulo, o número de empresas da indústria que fecharam suas portas entre ja­neiro a maio foi o maior de mais de uma década. Isso provoca um revés nos empregos industriais, em geral formais e de melhor qualidade. O polo calçadista, por exemplo, que empregava 12 mil trabalhadores no período Lula, hoje tem apenas 5 mil funcionários. Em outros setores, multinacionais têm transferido filiais para outras unidades, parte deles sem receber salários e indenizações. A Pirelli anunciou o fechamento da unidade de Gravataí (RS) e a demis­são dos 900 funcionários, ao unificar a produção de pneus de motos à de carros em Campinas (SP), onde pro­mete gerar apenas 300 vagas até 2022.

 

Alberto Handfas é doutor em Economia pela New School for Social Research e vice-coordenador do curso de Ciências Econômicas da Unifesp