Mobilização busca a retirada da PEC 32 para evitar o fim dos serviços públicos

Mobilização busca a retirada da PEC 32 para evitar o fim dos serviços públicos

A criação de Fórum Parlamentar pelo Fortalecimento do Serviço Público e das Empresas Públicas, Plenária Estadual dos Sindicatos dos Servidores Públicos das três esferas, em Santa Catarina, aprovação de moções de repúdio pelas Câmaras de Vereadores, realização de audiências públicas nos municípios e um dia sem serviço público em Santa Catarina, além de manifestações contra os deputados federais e senadores traidores da classe trabalhadora. Estas são algumas das estratégias de luta para exigir a retirada imediata da Reforma Administrativa do governo Bolsonaro-Paulo Guedes, no Congresso Nacional, e que foram aprovadas durante Audiência Pública da Comissão de Trabalho, Administração e Serviço Público da Assembleia Legislativa, na tarde de ontem (24). A Audiência foi uma iniciativa da deputada Luciane Carminatti (PT).

“Há necessidade de um debate amplo da sociedade brasileira sobre a Proposta de Emenda Constitucional 32/2020”, defende a deputada Luciane, que convidou lideranças sindicais dos servidores públicos – o Sintespe esteve representado pelo diretor Rodrigo Souza – para se pronunciarem contra a medida. “Se a gente quer enfrentar os problemas que têm no serviço público, precisamos primeiro ouvir o servidor”, disse. O presidente do Sinjusc (Servidores do Judiciário de SC), Hélio Lentz Puerta Neto, conclama para a “necessidade de resistir a esse projeto de sociedade que exclui a classe trabalhadora, para reconstruí-la sob outros valores, de solidariedade, equidade e justiça social”. Na sua avaliação, a Reforma Administrativa, cujo relator é o deputado catarinense Darci de Matos (PSD) – duramente criticado durante a audiência – “desestrutura o modelo atual de serviço público universal, de qualidade e gratuito.

Não se trata de reforma administrativa, mas de um projeto de sociedade que todos devemos refutar e que se intensificou em 2016, com o golpe de estado ocorrido no Brasil, que Hélio Neto chama de “choque neoliberal” e que gerou 14 milhões desempregados, jogou 3,6 milhões de brasileiros na linha da pobreza e 60% dos trabalhadores na informalidade. Todo esse quadro exige ação cada vez maior do Estado, “ou criamos mecanismos de amparo ou assistiremos o desastre que já acontece”, advertiu. O dirigente do Sinjusc chamou Darci de Matos de “hipócrita e cretino” por dizer que a reforma administrativa ‘vai acabar com marajás’.

“Onde estão os servidores?”, questionou Hélio Lentz, lembrando que 39,8% deles estão na Educação Básica e na Saúde (53,1% na linha de frente do combate à Covid) e que 82,2% estão nos municípios e estados, recebendo até quatro salários mínimos (53,1%, dos quais 23% ganham até dois Salários Mínimos). “São professores, enfermeiros, agentes prisionais, técnicos judiciários, agentes administrativos, porque os juízes, promotores, parlamentares e militares não estão na reforma”. Para destruir a falácia de que existem muitos servidores no Brasil, Hélio cita a Noruega onde, de cada 100 trabalhadores, 30 são servidores públicos; na Suécia e Dinamarca eles são 28%, nos EUA, 20%. No Brasil, o percentual de servidores é de 16,9% e, em Santa Catarina, de 10,1%.

Serviço público é o patrimônio de quem não tem patrimônio

 

A Reforma Administrativa de Bolsonaro-Guedes retira do Estado o dever de prover serviços públicos, passando-o para a iniciativa privada, “o que é gratuito, passa a ser pago”. Hélio Lentz destaca os Artigos 37 e 37-A – da Subsidiariedade – em que União, estados e municípios poderão firmar convênios privados para substituir servidores públicos. E também o Artigo 39-A, que prevê cinco possibilidades de contratação, sem concurso público, com prazos determinados e de liderança e assessoramento (cargos comissionados). Pelos cálculos aproximados, há a possibilidade de um milhão de cargos contratados sem concurso. A reforma também acaba com a estabilidade (Artigo 41), garantindo estabilidade apenas para cargos típicos de estado – “o alto escalão, não para o professor, enfermeiro, que são as verdadeiras atividades típicas do estado”, denuncia. “Serviço público é o patrimônio de quem não tem patrimônio”, enfatiza o presidente do Sinjusc.

O diretor do Sindicato dos Analistas Tributários da receita Federal (Sindireceita), Geraldo Paes, destacou a necessidade de se defender “um estado que proteja, cuide, ampare e emancipe”. E lembrou: “O serviço público é uma atividade prestada por pessoas, para pessoas, não existe escola sem professor, serviço de saúde sem médico, enfermeiro, segurança pública sem profissionais”. A PEC 32 foi “tecnicamente mal construída e desconstroi o serviço público”. Geraldo informou que, no mundo ocorreram 884 ‘desprivatizações’ e reestatizações, citando a Alemanha, que realizou 348 reestatizações, porque percebeu que pioraram os serviços, houve aumento de tarifas e a despreocupação com os serviços públicos. Já o coordenador geral do Sinte (Trabalhadores em Educação), Luiz Carlos Vieira, reforçou que a PEC 32 significa o desmonte do estado e pavimenta o caminho para a privatização, abrindo a possibilidade do fim da gratuidade nos serviços públicos. “Esta Emenda Constitucional faz parte deu um pacote que começou com a EC 95, depois as reformas trabalhista e previdenciária, será a pá de cal sobre os direitos dos trabalhadores”.

Carlos Alberto Marques, presidente da Apufsc (Professores das Universidades Públicas), denunciou que a PEC 32 “é como se abdicássemos do Estado”. Ele lembrou que “não tem estimativas sobre o impacto financeiro da medida, continuaremos pagando impostos para outros fins privados”. A Proposta “permitirá o aparelhamento sem precedentes do Estado”. E defendeu: “Estabilidade não é privilégio, mas sim a garantia de isenção e impessoalidade de um serviço público imune às pressões ideológicas”. O diretor de comunicação do Sintespe (Trabalhadores no Serviço Público Estadual), Rodrigo Souza, “não se trata de uma reforma, mas da demolição administrativa”. Ele criticou especialmente o aumento da terceirização, previsto na PEC 32, e afirmou que, como sempre acontece, a PEC foi antecedida de campanha contra o servidor público: “O gestor é o responsável por gerenciar o serviço público”, enfatizou Rodrigo, “jogar o serviço público na lógica da empresa privada, minando os direitos trabalhistas, não garante melhoria dos serviços prestados à população”. O diretor do Sintespe também lembrou da reforma administrativa estadual (Lei 741/2019), que completou dois anos recentemente e trouxe transtornos para servidores ativos e inativos, como o congelamento de salários. “A área da Saúde foi a mais atingida, metade das gerência regionais foram extintas”, destacou.

O presidente do Sintrasem (Servidores Municipais ede Florianópolis), Renê Munaro, ofereceu aos participantes da Audiência a Cartilha produzida pela entidade, intitulada “Por dentro da Reforma Administrativa”, que traz detalhes sobre a destruição do estado brasileiro, contida na PEC 32. O presidente do Sindsaúde, Djeison Stein, criticou as Organizações Sociais (OS), “que já atuam no estado atualmente e que trouxeram problemas na gestão e no atendimento à população”. E advertiu: “Quando a população não tiver acesso a serviços públicos, aí sim a catástrofe será maior”, citando o exemplo da pandemia do coronavírus, com o fechamento de emergências de hospitais privados – “somente os hospitais públicos permaneceram abertos” – disse.

Um dia sem serviço público

Presente à audiência, de maneira virtual, o deputado federal Pedro Uczai (PT/SC), criticou que “a PEC 32 é a síntese da alteração total da relação do estado brasileiro com a sociedade, quando transforma a negação do direito como conquista individual, exclui milhões de pessoas e transforma o estado em outra configuração, onde não será mais indutor do desenvolvimento do país”. Para Pedro Uczai – o único deputado federal catarinense a votar contra a PEC 32 –, “o servidor tem que defender o seu direito, ter claro o que significará a reforma para ele e unificar esta luta” e, em relação à sociedade, “tem que defender o serviço e o servidor público, porque ele que garante o direito universal à saúde, educação, segurança, etc”. Por tudo isso, o deputado sugere a realização de “um dia sem prefeitura, sem atividade pública, que todos fiquem em casa, para que as pessoas se dêem conta do que significa um dia sem serviço público à população”.