Dia Mundial da Conscientização do Autismo: o preconceito ainda persiste

Dia Mundial da Conscientização do Autismo: o preconceito ainda persiste

Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) indicou que uma a cada 160 crianças é autista

 

Fonte: Correio Braziliense

 

Nesta terça-feira (2/4) é celebrado o Dia Mundial da Conscientização do Autismo e o início do Abril Azul — mês de luta pelos que vivem com o transtorno. Mesmo com o esforço pela causa, as barreiras enfrentadas por pacientes e familiares ainda são grandes. A maior delas, segundo especialistas, é o preconceito. A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) indica que, atualmente, a cada 160 crianças, uma tem o diagnóstico positivo para autismo.

 

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil tem 38,5 milhões de crianças de 0 a 13 anos. Ao aplicar o índice da Opas, dessas, cerca de 241 mil seriam autistas. A estimativa, contudo, é que o número seja ainda maior. Estudiosos acreditam que esse número pode chegar a 2 milhões de brasileiros. A causa para a discrepância dos dois dados é a dificuldade em se obter o diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA).
“Hoje, para se fechar um diagnóstico, é necessário fazer uma complexidade de exames”, explica Emanoele Freitas, neurocientista especialista em transtorno do neurodesenvolvimento. Ela é responsável pela Associação de Apoio à Pessoa Autista (Aapa), que contribui com o tratamento do transtorno no Brasil. A principal motivação foi o filho, Eros Micael, 15 anos, diagnosticado com autismo. Segundo Emanoele, a maior dificuldade para quem enfrenta o autismo é, de fato, o preconceito. “As pessoas não buscam orientação, não tentam entender. Muitas vezes são intolerantes”, lamenta.
Apesar das barreiras, há avanços na área. Para Emanoele, a população melhorou, aos poucos, a sensibilidade em tratar os autistas. “Desde 2008 – quando iniciou-se o Abril Azul –, a gente começou a buscar cada vez mais a conscientização do autismo no Brasil. Em 2012, com a Lei Berenice Piana, isso se tornou cada vez mais possível”, informa. A lei a qual a neurocientista fala leva o nome de uma mãe que lutou durante anos para conseguir os devidos tratamentos para o filho. A legislação instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista.

Dificuldade na saúde

O acesso ao tratamento devido para quem tem autismo é restrito e aponta dificuldades. “Ainda não temos bom acesso, nem no setor público, nem no particular”, criticou Emanoele. Por ter um filho com o transtorno, a médica já passou por dificuldades em achar profissionais que oferecessem a assistência necessária. “Isso é uma das questões que a gente vê que ainda não mudou. A pessoa cursa enfermagem, medicina e ela tem que estar pronta para isso”, reclamou.
Ela contou, também, que a maior dificuldade foi durante a infância de Eros, dos 4 aos 8 anos de idade. “Hoje eu consigo dizer que experimento um momento de tranquilidade. Ele está melhorando, consigo perceber isso e as outras pessoas também”, explicou. A inquietação era o fator que mais dificultava a criação do menino. Agora, com 15 anos e com o tratamento adequado, o adolescente já desenvolveu melhor a questão social.
Professor, doutor em educação e especialista em autismo, Eugênio Cunha concorda que o sistema de saúde tenha problemas para atender os que sofrem com o transtorno. “A saúde tem ações e papéis legais. O autista tem maior respaldo para ser atendido na saúde, na educação, mas, por outro lado, os profissionais ainda não estão preparados para receber um autista”, explicou.
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“Isso é uma das causas do movimento. As pessoas precisam ficar mais atentas aos sintomas. Na área da saúde, as pessoas que lidam com esse tipo de situação devem saber como lidar, como tratar com isso”, analisou Cunha. “Eu acho que o desconhecimento da sociedade é um problema. Como a pessoa não sabe o que é o autismo, ela não sabe lidar com o transtorno”, completou.
Segundo o Ministério da Saúde, os pacientes com autismo podem ser atendidos no Sistema Único de Saúde (SUS), nos serviços que compõem a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). Segundo a pasta, a rede de reabilitação em todo o país conta com 2.385 serviços de reabilitação e estimulação credenciados no SUS, com 217 Centros Especializados em Reabilitação (CERs); 36 Oficinas Ortopédicas; 236 serviços de reabilitação em modalidade única; e 1.896 serviços de reabilitação credenciados pelos estados e municípios.
“O atendimento nos Centros Especializados em Reabilitação compreende, além da avaliação multiprofissional, acompanhamento em Reabilitação Intelectual e dos Transtornos do Espectro do Autismo (TEA), bem como orientações para uso Funcional de Tecnologia Assistiva. A avaliação multiprofissional é realizada por uma equipe composta por médico psiquiatra ou neurologista e profissionais da área de reabilitação para estabelecer o impacto e repercussões no desenvolvimento global do indivíduo e sua finalidade”, informou o texto.
No DF, há duas portas de entrada para o acolhimento de demanda espontânea de pacientes com expector autista na rede pública de saúde: Atenção Primária à Saúde, por meio das unidades básicas de saúde, e os centros de atenção psicossocial (Caps).
O acompanhamento dos pacientes é feito nos Centros de Atenção Psicossocial Infantojuvenis (CAPSi), Centro de Orientação Médico Psicopedagógica (COMPP), Centro Especializado em Reabilitação (CER II CEAL), Adolescentro e Hospital da Criança de Brasília José de Alencar.

Mitos e verdade sobre o transtorno

Cunha também levantou alguns dos mitos sobre o transtorno, temas abordados em seus livros. Ele é autor Autismo e inclusão – psicopedagogia e práticas educativas na escola e na família; Autismo na Escola – um jeito diferente de aprender, um jeito diferente de ensinarPráticas pedagógicas para a inclusão e diversidade e Afeto e aprendizagem – relação de amorosidade e saber na prática.
“É mito falar que o autismo é uma doença. É um transtorno. Também é falso dizer que o autista não tem afetividade e que não gosta de pessoas”, afirmou. Além disso, o professor frisou que o autismo pode melhorar ao longo da vida e do tratamento. “Ele aprende independentemente do nível do comprometimento. A questão é como ensinar. Ele tem empatia e suas próprias dimensões afetivas, mas a sociedade tem que entender essa maneira de se expressar que o autista tem”, ressaltou. Os principais sintomas são a dificuldade de interação social, dificuldade de comunicação, e “forma literal de agir”, inflexível, com baixa aceitação de mudanças na rotina.

 

(foto: Valdo Virgo/CB/D.A Press)