O que se sabe até agora sobre a morte de Marielle?
A Polícia Civil do Rio de Janeiro tenta esclarecer a morte da vereadora Marielle Franco, do Psol, e de seu motorista, Anderson Gomes, na quarta-feira 14. Sob pressão de ativistas, políticos e entidades nacionais e internacionais, os investigadores seguem sem resposta.
A principal hipótese analisada pela Delegacia de Homicídios do Rio é de que se tratou de uma execução premeditada, dada a ação dos criminosos. Amigos e familiares de Marielle acreditam que ela não chegou a sofrer ameaças de morte. Nenhum suspeito foi preso até agora.
O assassinato da vereadora provocou comoção e indignação em todo o Brasil. Milhares de manifestantes foram às ruas em várias cidades do país em repúdio à morte de Marielle e também como forma de reiterar o apoio a temas pelos quais ela lutava, como os direitos das mulheres e a inclusão social. A vereadora era conhecida ainda por ser crítica da violência policial.
Quase cinco dias após o assassinato, os investigadores já têm informações sobre a origem na munição utilizada, tem imagens de câmaras de segurança instaladas na região do crime e apreendeu um carro suspeito de ter sido o utilizado pelos assassinos. Não há indícios, porém, de quem mandou ou executou a morte de Marielle.
Confira o que se sabe até agora sobre a morte da vereadora Marielle Franco:
Local da morte
O incidente ocorreu na rua Joaquim Palhares, no bairro do Estácio, a 700 metros da prefeitura do Rio e a 100 metros de uma estação de metrô.
Como agiram os criminosos
Os atiradores emparelharam um carro ao lado do de Marielle, abriram fogo e fugiram rapidamente do local, sem cometer nenhum roubo. A vereadora estava no banco de trás do veículo, um Chevrolet Agile branco, acompanhada de Anderson Gomes, o motorista que também foi morto na ação, e de uma assessora, que foi atingida por estilhaços e teve ferimentos leves.
O carro foi baleado nove vezes. De acordo com a Polícia Civil, todos os disparos foram em direção ao banco de trás, onde estava a vereadora. Ela foi alvejada com ao menos quatro tiros na cabeça, e Anderson Gomes foi atingido por três disparos na lateral das costas.
A Polícia Civil acredita que Marielle foi seguida desde o momento em que saiu do evento no bairro da Lapa, num percurso de quatro quilômetros até o local onde seu carro foi alvejado.
Câmeras de segurança
Imagens de câmera de segurança, obtidas pela TV Globo, mostram como os prováveis suspeitos ficaram de tocaia pouco antes do assassinato de Marielle e do motorista Anderson.
Às 6h58m do dia do crime um Cobalt prata para perto do local do evento em que a vereadora iria participar. Sem vaga para estacionar, fica na saída de um beco. O veículo apagou todas as luzes. Dentro do carro havia motorista mexendo no celular e uma outra pessoa – é possível ver o braço dela no banco de trás.
Dois minutos depois, o carro dirigido por Anderson passar perto do veículo e para mais a frente. Marielle e outra pessoa descem do carro e entram na Casa das Pretas, espaço coletivo de mulheres negras. Anderson volta de ré, na contramão e quase bate no carros dos suspeitos.
Às 19h10m, o Cobalt muda de lugar assim que abre uma vaga. Vinte minutos depois, Anderson também consegue uma vaga em frente ao carro dos prováveis assassinos. Ele desce do veículo, entra na casa, saí e anda pela rua.
Às 20h54m, Anderson volta para o carro, e Marielle sai junto com a assessora do local do evento às 21h03m. Nas imagens, a Marielle, que sempre andava no banco da frente com o motorista decide ir atrás com a assessora. É a última a entrar no carro, no banco de trás, pela porta da direita.
Assim que o carro de Marielle parte, o Cobalt sai atrás, todo apagado. Logo em seguida, um segundo veículo prata seguindo o Cobalt. A polícia acredita que os dois veículos tenham participaram do crime.
Imagens de câmeras de segurança do Centro do Rio mostram o carro onde estava a vereadora aparentemente sendo seguido por outros dois veículos de cor prata. O veículo onde estava o atirador – o Cobalt prata estava clonada. O outro, um Logan, teria dado cobertura ao crime.
Nas imagens obtidas pela TV Globo é possível ver parte do trajeto por onde Marielle, a assessora e o motorista Anderson Gomes passaram antes de serem atacados na Rua João Paulo I, no bairro do Estácio, na última quarta-feira.
Às 21h07m, poucos minutos depois de a vereadora ter deixado o local onde participou de um evento, na Lapa, uma câmera da prefeitura localizada na Avenida Salvador de Sá, já no Estácio, mostra o carro branco onde estava Marielle passando e ainda sendo seguido pelos mesmos dois veículos. Nas imagens é possível ver que um dos carros ultrapassa o outro, pouco antes do local onde o veículo dirigido por Anderson foi atingido pelos tiros.
Mais de um veículo envolvido
A polícia investiga ainda a participação de outros dois veículos, que teriam dado cobertura aos atiradores. Um dos carros foi visto durante duas horas nos arredores da Casa das Pretas, na Lapa, onde Marielle participava do debate, e mais tarde seguiu o carro da vereadora. A placa foi identificada como sendo de Nova Iguaçu, município na Baixada Fluminense.
Segundo imagens de câmeras de segurança, dois homens estavam dentro do veículo e falavam no celular. Os investigadores coletam dados com as operadoras de telefonia para tentar identificar os autores das chamadas, bem como as pessoas com quem eles conversavam.
De acordo com a polícia, esse veículo teria trocado sinais de farol com um terceiro carro no momento da saída de Marielle do local. Ela e o motorista foram mortos minutos mais tarde, a quatro quilômetros dali.
No domingo 18 a Polícia Civil de Minas Gerais anunciou que apreendeu na madrugada um carro que pode ter isso usado por criminosos no assassinato da vereadora. O veículo foi aprendido no município de Ubá, na Zona da Mata. A confirmação depende ainda da realização de uma perícia.
Arma do crime
A munição utilizada pelos criminosos foi calibre 9 mm, que pode carregar submetralhadoras ou pistolas. Essa munição pode ser adquirida apenas por forças de segurança, colecionadores e atiradores esportivos. As balas de calibre 9 mm podem ser compradas mais facilmente no Paraguai, de onde são contrabandeadas para o Brasil e vendidas no mercado negro.
Segundo informações obtidas pela Rede Globo, a munição usada no crime é de lotes vendidos pela empresa CBC para a Polícia Federal de Brasília em dezembro de 2006. Uma perícia da Divisão de Homicídios indica que o lote é original, ou seja, a munição não teria sido recarregada.
O lote é o mesmo usado em uma chacina em agosto de 2015 em Barueri e Osasco, na Grande São Paulo, considerada a maior da história do estado, com 17 mortos. Três policiais militares e um guarda civil foram condenados nesse caso.
Diante das novas informações, a PF instaurou um inquérito para apurar a origem das munições e as circunstâncias envolvendo as cápsulas encontradas no local onde a vereadora foi morta.
Na noite da sexta-feira 16, o ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann, afirmou que as munições foram furtadas da sede dos Correios da Paraíba em 2006. No sábado 17, porém, os Correios informaram não que desconhecem o furto apontado pelo ministro. “Não há nenhum registro de qualquer incidente dessa natureza e que está apurando internamente as informações”, disse a empresa, em nota.
Manifestações em todo o país
Milhares de pessoas saíram às ruas de várias cidades brasileiras em atos de protesto contra a morte de Mariella e a violência. No Rio de Janeiro, uma grande multidão tomou a praça em frente à Câmara dos Vereadores. Manifestações ocorreram também em outros pontos do centro da cidade.
Em São Paulo, milhares de pessoas fecharam a Avenida Paulista num ato de repúdio ao assassinato. Protestos ocorreram também em várias capitais do país e também em Nova York e Portugal.
Deputados da bancada de esquerda do Parlamento Europeu condenaram o assassinato da vereadora e pediram à União Europeia (UE) que, diante do caso, suspenda as negociações do acordo comercial com o Mercosul.
Em sessão na sede do Parlamento em Estrasburgo, na França, vários eurodeputados ergueram cartazes com a frase “Marielle presente, hoje e sempre” em homenagem à política carioca.
Fake news e difamação
A morte da vereadora também resultou na disseminação de boatos e mentiras em redes sociais. Correntes e publicações apontaram sem provas e com erros grosseiros de informação que Marielle era, por exemplo, “esposa” de um traficante ou que a vereadora recebeu ajuda eleitoral da facção Comando Vermelho. Os boatos foram desmentidos por sites de checagem de dados.
Ainda assim, uma desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio chegou a reproduzir as mentiras em uma publicação na sua conta no Facebook. Após ser criticada, a desembargadora Marilia Castro Neves, admitiu que viu originalmente as informações do “texto de uma amiga” e que nem sequer havia ouvido falar de Marielle antes do crime.
Horas depois, foi a vez do deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF), um membro da “bancada da bala” da Câmara, reproduzir as mentiras em sua conta no Twitter. Após receber centenas de críticas, apagou a publicação e admitiu que havia reproduzido “fake news” que recebeu em uma corrente.
O PSOL, partido da vereadora assassinada, disse que pretende abrir uma ação criminal contra a magistrada por calúnia e difamação.
*Com informações da Deutsche Welle
Fonte: Carta Capital