Déficit da previdência, se existe a culpa não é do servidor público
Em plena pandemia, o governo Moisés faz a segunda tentativa de alterar a legislação que trata da aposentadoria e pensões do conjunto dos servidores civis do Estado de Santa Catarina. Falamos da décima alteração do Regime Próprio de Previdência Social, que tem no IPREV a sua unidade gestora, mantido e pactuado pelo Estado ao longo de mais de um século de existência, considerando que o primeiro ato legislativo foi editado em 1909, quando fez surgir o Montepio dos Funcionários Públicos do Estado de Santa Catarina.
O argumento central para tal iniciativa do governo é sempre o mesmo: conter o déficit financeiro do sistema previdenciário. Como assim, “déficit previdenciário”, se os servidores públicos civis do estado sempre pagaram a parte devida ao IPESC/IPREV, hoje de 14% sobre toda a remuneração bruta, sem falhar um mês sequer?
Devemos falar de gente, de famílias e não só de números. E quem é esse contingente de trabalhadores que integram a Previdência do Estado de SC? Majoritariamente, são servidores da Educação pública, profissionais da Saúde pública e profissionais da Segurança pública, representando 85% das vidas (pensões e aposentadorias) do Regime Próprio de Previdência.
Pedindo licença para limitar minha contribuição a partir do sussurrado déficit, é de bom alvitre que o Excelentíssimo Senhor governador Carlos Moisés e, porque não, a classe política expliquem ao povo catarinense os seguintes fatos e dados oficiais da mais alta importância para medir a responsabilidade dos agentes políticos do passado e presente, a saber:
1 – O Estado de SC, até 20 anos atrás, nunca efetuou o pagamento da sua contribuição previdenciária patronal. Estamos falando de sonegação da contribuição patronal ao longo de 90 anos.
2 – O Estado não efetua desconto de qualquer outro tipo de contribuição social do salário sobre a folha de pagamento, muito menos paga o FGTS assegurado aos demais trabalhadores por não possuírem a estabilidade.
3 – Em negociação com o Governo Federal, 20 anos atrás, via “manobra financeira”, o Estado federalizou a sua dívida para com o IPESC (hoje IPREV), à época 1 bilhão de reais. Ao ser federalizado, o dinheiro veio de Brasília, não foi capitalizado. O IPREV ficou sem o dinheiro e diretamente o Tesouro se apropriou de algo que não deveria ser seu.
4 – Recentemente, o Tesouro do Estado meteu a mão em mais 900 milhões de reais, que estavam disponíveis no Regime de Capitalização da Previdência Estadual, em conta separada pelo IPREV, e fez virar fumaça.
5 – E, por último, segundo dados tabulados pelo Governo Moisés (que por ser militar pode falar de cadeira), existe o segmento Militar, que, por não ter sido atingido por nenhuma outra reforma da previdência, contribui com 10%, descontados em folha do efetivo, enquanto o Estado não recolhe a sua parte patronal e também nada pagou no passado, durante 120 anos. Por sua vez, os servidores civis entram com a contribuição de 14% e a parte patronal com até 28%.
Não menos importante é o fato de que os servidores civis do Poder Executivo sofrem há mais de 10 anos com o congelamento dos seus vencimentos – sem planos de cargos, tabelas achatadas e até com o vencimento fixo abaixo do valor do Salário Mínimo -, e estão sufocados pelo limite de gastos com pessoal, por imposição da Lei de Responsabilidade Fiscal, de 49% do montante apurado pela Receita Liquida Disponível do Estado.
Pois bem, atenção: no total de gastos com pessoal do Poder Executivo estão incluídos todos os pagamentos com aposentadorias e pensões. E qual a dedução que se tira? Hoje, quem paga o citado déficit da previdência já é o próprio servidor público civil do Estado. E paga inclusive o suposto déficit previdenciário que o Chefe do Poder Executivo do Estado de SC diz existir no setor militar, que anualmente é da monta de 1 bilhão e 300 milhões de reais, ou seja, 26% do valor global.
Sendo assim, só resta identificar que a Reforma da Previdência que está para aportar na Assembleia Legislativa de SC tem o condão de buscar encobrir a verdade e fazer do servidor público do Estado de SC bode expiatório. Ou, quem sabe, tentar justificar os fracassos daqueles que muito prometem e só lembram às portas de um novo pleito eleitoral.
Antônio Luiz Battisti
Presidente do SINTESPE – Sindicato dos Servidores Públicos Estaduais de SC