Movimento sindical de Santa Catarina apresenta resposta à carta patronal enviada ao Governador Moises

Movimento sindical de Santa Catarina apresenta resposta à carta patronal enviada ao Governador Moises

Senhor Governador, Carlos Moises

Primeiramente, não há como iniciar qualquer manifestação sem externar nossos sentimentos as 8.377 famílias catarinenses que perderam entes queridos para o coronavírus, bem como as 272.889 no Brasil. É quase inimaginável termos um universo de mais de 1 milhão de pessoas enlutadas neste momento. Detalhe: muitas destas mortes eram evitáveis.

O Sr. conhece os números, inclusive, acreditamos que todas as noites se lembre deles.

Atualmente, Santa Catarina tem quase 40 mil casos ativos da doença. Na fila de espera para UTI são 419. Pessoas morreram esperando leito. Repetimos: morreram esperando.

A pandemia não começou ontem. Ela paira pelo ar (literalmente) desde março de 2020. Nada do que está ocorrendo pode ser trazido para o campo do imponderável. Nada é surpresa. Ao contrário, alertas para evitar cenários como o que vivemos foram feitos reiteradamente por diversas pessoas e organizações nacionais e internacionais especializadas.

Importante que se diga: chegamos aqui por uma escolha, Sr. Governador. Uma escolha sua, do seu governo e das pessoas que o cercam. A gestão da crise pandêmica desde seu início em março de 2020 (ressalvado o período do seu afastamento) foi realizada sob seu comando, logo, a responsabilidade por tudo isso é do seu governo.

Se o Sr. Governador avalia que tomou providências, também temos algo a dizer: se houve planejamento e execução de uma política de enfrentamento ao coronavírus eles não deram e não darão certo.

As medidas restritivas adotadas não surtiram efeito. A doença avança perigosamente. Apenas nos primeiros 10 dias de março, morreram 919 pessoas em Santa Catarina.

Vacinação em massa, apoio financeiro às pessoas e às empresas que não têm condições de sobreviver, isolamento e distanciamento social são as medidas adotadas nos países que hoje estão com a pandemia relativamente controlada (ou em curva descendente).

Diante do que especialistas nacionais e estrangeiros apontam, com todo conhecimento e acesso à informação causa surpresa, espanto, perplexidade e revolta a forma como o Poder Público tem tratado da questão no Brasil. Trata-se de uma escolha deliberada. Os governantes optaram por deixar que pessoas morressem sob um pseudo-pretexto de retomada econômica. E, infelizmente não se tratam de palavras ao vento, mas sim corpos enterrados no chão.

Em Santa Catarina isso ganhou tal proporção a ponto do Ministério Público e da Defensoria Pública do Estado ingressarem com ação civil pública requerendo, sem sede de tutela de urgência, para que o Estado estenda as restrições dos finais de semana por 14 dias contínuos, sem prejuízo de outras restrições de atividades que entenda possíveis e necessárias à maior eficiência da medida, em especial com relação a atividades industriais.

Aliás, ressaltamos que este grau de medida restritiva, necessária para conter o avanço do contágio e das mortes, é fruto de má gestão. Se houvesse um projeto bem construído, talvez não fosse necessário. Mas, certamente, está é hoje a única forma eficaz para salvar as vidas dos catarinenses.

Quaisquer outras formas são paliativas e, além de não resolverem o problema, matarão mais e mais pessoas diariamente.

Para completar a perplexidade, o Sr. se negou a assinar o Pacto Nacional em Defesa da Vida e da Saúde, em que 21 Governadores foram signatários numa junção ampla de forças (de várias vertentes políticas) pedindo ao Governo Federal a expansão da vacinação e o apoio aos Estados para ampliação e manutenção de medidas preventivas, bem como na montagem de leitos.

Frisamos novamente: seu plano não deu certo e os números provam isso. Qual o motivo de não assinar este Pacto pela vida?

O Brasil possui uma Política Nacional de Imunização (PNI) desde 1973, a qual a partir da criação do Sistema Único de Saúde (SUS) em 1988 ganhou notoriedade como referência mundial do processo de imunização da população. O Brasil conseguiu erradicar a poliomielite, o sarampo, a rubéola e todas as doenças imunopreveníveis que disseminavam aos milhares, a ponto de haver enfermarias nos hospitais para atender estes casos em específico. Por conta da PNI estas enfermarias deixaram de existir.

Há que se ressaltar que o Brasil já foi uma das populações mais imunizadas do mundo. O processo de fabricação de imunobiológicos é (ou era) referência para os demais países.

Chamamos este histórico porque nosso Brasil já possui um Sistema de Saúde Pública capaz de efetivar uma política de imunização em larga escala. Sequer seria algo inédito, caso estivéssemos num processo acelerado de imunização e fabricando vacinas.

Saímos da referência mundial em saúde pública para a vergonha mundial. E o seu governo faz parte do grupo de gestores destroem a imagem do Brasil perante o mundo.

Também ficamos perplexos ao ler uma carta direcionada ao Sr. Governador, escrita por entidades comerciais e empresariais de diversos municípios de Santa Catarina. Entre os argumentos desconexos apresentados no documento saltam aos olhos duas questões: a) em nenhum momento se lamenta o número de vítimas pelo Coronavírus; b) em nenhum momento se faz proposição de uma política de imunização ou, pior, sequer citam a necessidade de agilização da vacina.

A qualquer custo, mesmo que seja a vidas de pessoas, querem manter tudo aberto e funcionando normalmente, como se o vírus fosse “uma gripezinha” ou “coisa de maricas”, alinhando-se às posturas deploráveis de Jair Bolsonaro, que é o pior exemplo mundial no combate à pandemia.

Ora, se se pretende que todos voltem à “normalidade”, a vacina é, inegavelmente, o caminho mais rápido.

E nós, trabalhadores e trabalhadoras, da esfera pública e privada, dizemos: nós queremos trabalhar. Mas para alguns grupos de empresários a carteira assinada, final de semana e férias remuneradas, possibilidade de licença de saúde, condições salubres de trabalho são privilégios. Estas pessoas querem que a força de trabalho se submeta aos seus desmandos.

Dizemos que estes direitos não são privilégios. Cada um deles foi conquistado com muito suor e sangue. Numa perspectiva histórica, estas pessoas que apoiam posições como estas e, ainda, disseminam as condutas do presidente Jair Bolsonaro na pandemia, que entre outras ações, tem atacado os direitos trabalhistas, são as mesmas pessoas que no passado argumentavam que o fim da escravidão levaria a economia à ruína. São as mesmas pessoas que queriam manter o trabalho infantil nas fábricas para que seus negócios pudessem prosperar. São as mesmas pessoas que mantêm famílias em suas terras trabalhando de domingo a domingo num casebre em troca de comida.

Definitivamente, nós não somos estas pessoas. Estamos em lados opostos da história. Mas também nos preocupamos com elas, pois muito embora o vírus não escolha quem irá contaminar, sabemos quem são as pessoas mais vulneráveis para se contaminar e para o tratamento da doença. O vírus mata trabalhadores e mata empresários.

Sim, queremos trabalhar, mas sob condições dignas e saudáveis. Não podemos colocar o lucro acima da vida das pessoas. Acreditamos, baseados naquilo que diz a comunidade científica, que o isolamento social e a vacinação são as medidas mais eficientes e rápidas para nos tirar desta situação.

Outro fator importante de ressalvar é que esta pandemia demonstrou que a cada dia pode ser iniciado um ciclo de enfrentamento à disseminação do vírus, mas para isso é necessário que medidas adequadas sejam tomadas.

Isso significa dizer que todos os dias o Sr. Governador e seu governo têm a oportunidade de mudar o rumo desta história trágica.

Precisamos frear o Coronavírus e suas variantes. Sem isso, o que temos são mais mortes e o distanciamento ainda maior da retomada econômica. Inclusive, importante recordar que a arrecadação tributária em Santa Catarina no mês de janeiro atingiu a marca histórica de R$ 3 bilhões, ou seja, existem condições para o governo do Estado tomar medidas sanitárias e econômicas para uma guinada no enfrentamento da pandemia.

Quatro pontos fundamentais precisam ser implementados:

a) aceleração do processo de vacinação de toda população catarinense;

b) isolamento social;

c) reforço humano na área da saúde;

d) renda aos trabalhadores e desoneração aos pequenos e médios empresários.

Por isso, exigimos que seja estendida durante a semana o fechamento dos serviços não essenciais, pelo prazo de 14 dias, criando-se condições financeiras para que pessoas e empresas possam sobreviver a este período.

Exigimos que sejam contratados mais profissionais da área da saúde para suprir as demandas nos hospitais, bem como que seja acelerado o processo de vacinação da totalidade da população catarinense.

Queremos trabalhar, mas, antes disso, queremos nos manter vivos.

Se formos colocados em situação de risco de morte, seremos obrigados a fazer greve pela vida.

Florianópolis, 12 de março de 2021.

Esta cara foi construída pelo movimento sindical e assinada por mais de 200 entidades, entre elas o SINTESPE. Veja todas aqui.


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